Criado há 53 anos, o Clube Bilderberg reúne anualmente, em caráter
sigiloso, nomes influentes da política, da economia e da mídia do
Ocidente para debater assuntos de interesse mundial.
Por Por Eduardo Araia
É tudo muito discreto: quem atende o telefone do Clube Bilderberg, em
Leiden, na Holanda, é uma impessoal voz feminina que, após repetir o
número, sugere que a pessoa deixe uma mensagem após o sinal. Alguém mais
desavisado poderia até pensar que ligou por engano para uma residência.
Mas o que está por trás do tal número de telefone vai muito além disso:
para muitos, o Clube Bilderberg é omaestro oculto da política e da
economia ocidental há mais de cinco décadas. Todo o segredo que cerca
suas atividades (nem portal na Internet ele tem) só contribui para essa
imagem.
Fundado em 1954 pelo príncipe Bernhard, da Holanda, pelo
primeiro-ministro belga Paul Van Zeeland, pelo conselheiro político
Joseph Retinger e pelo presidente da multinacional Unilever na época, o
holandês Paul Rijkens, o Clube Bilderberg é uma organização não-oficial
que nasceu supostamente para promover a "cooperação transatlântica" e
debater "assuntos relevantes em nível mundial" - o que, em plena Guerra
Fria, equivalia a discutir a ameaça comunista. O nome Bilderberg vem do
hotel holandês que abrigou a primeira reunião, em 1954. O sucesso desse
evento convenceu os seus organizadores a realizá-lo anualmente, em algum
país europeu, nos Estados Unidos ou no Canadá.
Atualmente, os encontros do Clube reúnem cerca de 120 personalidades
européias e norte-americanas influentes na política, na economia e na
mídia. Eles ocorrem em hotéis sofisticados e preferencialmente isolados,
que são fechados por ocasião do evento.
Nesse período, um fortíssimo esquema de segurança, a cargo de agentes
norte-americanos e de vários outros países europeus, além da polícia
local, garante a privacidade dos participantes. A conferência mais
recente foi realizada no Ritz-Carlton de Istambul, na Turquia, entre os
dias 31 de maio e 3 de junho.
O COMITÊ organizador das conferências tem sido bastante criterioso
nas suas seleções de convidados, como se pode constatar pelas listas
disponíveis. O polêmico ex-secretário de Defesa norte-americano Donald
Rumsfeld era nome habitual nos encontros, assim como Peter Sutherland
(ex-diretor-geral da Organização Mundial do Comércio, atual
diretor-executivo da British Petroleum e da Goldman Sachs International e
membro do comitê organizador do Bilderberg), Paul Wolfowitz
(ex-subsecretário de Defesa do governo de George W. Bush e ex-presidente
do Banco Mundial) e Henry Kissinger (ex-secretário de Estado
norte-americano).
... Clã de seletos
Na página oposta, o príncipe Bernhard, da Holanda, um dos fundadores
do Clube Bilderberg. Ao lado, no sentido horário, alguns dos nomes que
já o integraram ou que ainda fazem parte dele: a rainha Beatrix, da
Holanda; o bilionário David Rockefeller; Henry Kissinger, ex-secretário
de Estado norte-americano; Donald Rumsfeld, ex-secretário de Defesa dos
Estados Unidos; e Javier Solana, ex-secretário-geral da Otan.
Bill Clinton, Tony Blair, o ex-secretário- geral da Organização do
Tratado do Atlântico Norte (Otan) Javier Solana e os bilionários David
Rockefeller e Bill Gates também já integraram essa exclusiva relação
(veja no quadro alguns dos nomes convidados para a conferência deste
ano).
Ao reunir tanta riqueza e poder e zelar pela privacidade absoluta em
seus eventos (nenhum participante pode falar sobre o que viu e ouviu nos
encontros), o Clube Bilderberg se tornou prato cheio para as teorias
conspiratórias. Segundo elas, a organização manipula políticas nacionais
e eleições, provoca guerras e recessões e chega a ordenar assassinatos e
renúncias de líderes mundiais - como teria acontecido, respectivamente,
com o presidente norte-americano John Kennedy e a primeira-ministra
britânica Margaret Thatcher.
PARA MUITOS sérvios, o Bilderberg foi o responsável pela queda de
Slobodan Milosevic. Fala-se ainda que três famosos terroristas - Timothy
McVeigh (responsável pelo atentado de Oklahoma City), David Copeland
(um dos responsáveis pelo atentado ao metrô de Londres) e Osama Bin
Laden - também pensam que os governos nacionais dançam conforme a música
tocada pelo Clube.
O curioso é que o Bilderberg incomoda tanto conservadores quanto
liberais. Para os primeiros, a organização é um plano sionista liberal.
Para os outros, com tanto cacife e sigilo envolvidos, coisa boa não deve
sair dali. "Quando tanta gente com tanto poder se reúne em um só lugar,
acho que nos devem uma explicação sobre o que está acontecendo", disse o
exjornalista britânico Tony Gosling ao jornalista Jonathan Duffy, do
BBC News Online Magazine ("Bilderberg: The Ultimate Conspiracy Theory",
de 3 de junho de 2004).
Por mais verossímeis ou DESCABELADAS que sejam, as ESPECULAÇÕES sobre
a verdadeira ATUAÇÃO do Clube Bilderberg dificilmente poderão ser
CONFIRMADAS ou refutadas
Segundo Gosling, o economista britânico Will Hutton, ex-participante das
... Influência
Na página oposta, a ex-primeira-ministra britânica Margaret Thatcher,
possível vítima do Clube; Bill Gates já teria participado das reuniões
secretas; e o terrorista Osama Bin Laden, que acredita no poder de
decisão do Bilderberg.
conferências do Bilderberg, comparou o evento ao encontro anual do
Fórum Econômico Mundial, no qual "o consenso estabelecido é o pano de
fundo contra o qual a política é feita em nível mundial". Gosling
exemplificou os perigos desse "consenso": "Um dos primeiros lugares onde
ouvi sobre a determinação de as forças norte-americanas atacarem o
Iraque foi no encontro de 2002 do Bilderberg, graças a um vazamento de
informação."
Os organizadores se defendem. Para o belga Étienne Davignon, exvice-
presidente da Comissão Européia, vice-presidente da multinacional
francesa Suez-Tractebel e atual presidente da conferência do Clube
Bilderberg, é impossível pensar em comando mundial único.
"Não creio numa classe governante global porque não creio que tal
classe exista", disse ele ao jornalista da BBC Bill Hayton ("Inside the
secretive Bilderberg Group", de 29 de setembro de 2005). "Apenas penso
que são pessoas influentes interessadas em conversar com outras pessoas
influentes."
O jornalista Martin Wolf, do diário inglês Financial Times, que foi
convidado para alguns encontros, também pensa que não há fogo atrás
dessa fumaça: "A idéia de que tais eventos não podem ser realizados na
privacidade é fundamentalmente totalitária", disse a Duffy. "Não é um
organismo executivo. Nenhuma decisão é tomada lá."
O EX-CHANCELER britânico Denis Healey, uma das presenças de primeira
hora das conferências do Clube Bilderberg, também minimizou as críticas:
"Nunca procuramos atingir um consenso sobre os grandes temas nas
conferências", disse a Duffy.
"É simplesmente um lugar para discussões." Healey é só elogios ao
Clube: "O Bilderberg é o grupo internacional mais útil do qual
participei. A confidencialidade permite às pessoas falarem honestamente,
sem medo das repercussões", acrescentou ele.
Por mais verossímeis ou descabeladas que sejam, as especulações sobre
a verdadeira atuação do Clube Bilderberg dificilmente poderão ser
confirmadas - ou refutadas - por completo. Elas, aliás, não surpreendem o
pesquisador britânico Alasdair Spark, especialista em teorias
conspiratórias ouvido por Duffy.
"A idéia de que uma panelinha sombria está mandando em todo o mundo
não é nada nova", comentou Duffy. "Por centenas de anos as pessoas
acreditaram que o mundo é governado por um grupo de judeus. Não
deveríamos esperar que os ricos e poderosos organizassem as coisas em
seu próprio interesse? Isso é chamado de capitalismo."
"A idéia de que uma panelinha sombria está mandando em todo o mundo
não é nada nova", comentou Duffy. "Por centenas de anos as pessoas
acreditaram que o mundo é governado por um grupo de judeus. Não
deveríamos esperar que os ricos e poderosos organizassem as coisas em
seu próprio interesse? Isso é chamado de capitalismo."
Lista seleta
Os 20 nomes relacionados a seguir, convidados pelo Clube Bilderberg
para a conferência deste ano em Istambul, são uma amostra da elite
ocidental reunida pela organização.
✧ Rainha Beatrix, da Holanda.
✧ Lloyd Blankfein, presidente e chefe-executivo do banco Goldman Sachs.
✧ Paul Gigot, editor da página de editoriais do Wall Street Journal.
✧ Jaap de Hoop Scheffer, secretário-geral da Organização do Tratado do Atlântico Norte.
✧ Rei Juan Carlos I, da Espanha.
✧ Muhtar Kent, presidente e diretor de operações da Coca-Cola.
✧ Henry Kissinger, ex-secretário do ex-presidente Richard Nixon e atual presidente da Kissinger Associates.
✧ Klaus Kleinfeld, presidente da Siemens.
✧ John Mickletwait, editor do The Economist.
✧ Jorma Ollila, chairman da Nokia e da Shell.
✧ Príncipe Philippe, da Bélgica
✧ Eric Schmidt, presidente e chefe-executivo do Google.
✧ Klaus Schwab, presidenteexecutivo do Fórum Econômico Mundial
✧ Javier Solana, secretário-geral do Conselho da União Européia.
✧ Michael Tilmant, presidente do ING Group.
✧ Jean-Claude Trichet, presidente do Banco Central Europeu.
✧ Daniel Vasella, presidente e chefe-executivo da Novartis.
✧ Jeroen van der Veer, chefeexecutivo da Shell.
✧ Paul Wolfowitz, presidente do Banco Mundial.
✧ Robert Zoellick (na época, executivo do Goldman Sachs. Assumiu a presidência do Banco Mundial em julho).